"O sistema endócrino foi desenvolvido para permitir que os processos fisiológicos sejam coordenados e regulados" - KLEIN, Bradley G.
USJT - VILA LEOPOLDINA
APLICAÇÃO CLINICA
DIABETES MELLITUS EM CÃES
Diabetes mellitus é considerada a principal doença do pâncreas endócrino em cães, representada como um grupo de doenças metabólicas de múltiplas origens e caracterizada por hiperglicemia, glicosúria e distúrbios no metabolismo de carboidratos, gorduras e proteínas, que surge como resultado de defeitos na secreção da insulina, defeitos na ação da insulina ou ambos. Este tipo de diabetes é caracterizado pelo excesso de glicose no sangue, é o tipo mais comum da doença e é caracterizada pela pouca produção do hormônio insulina pelo pâncreas. O grau de severidade da doença pode variar desde uma disfunção inicial assintomática até um distúrbio severo, que pode comprometer a qualidade de vida do animal. Os sinais clínicos típicos dessa doença são: poliúria, polidpsia, polifagia e perda de peso. (Drazner, 1987).
É um distúrbio endócrino de causa multifatorial. Hereditariedade, infecções virais, autoimunidade, pancreatite, obesidade, hipersecreção ou exposição prolongada aos hormônios diabetogênicos (epinefrina, GH, glicocorticóides e glucagon), administrações exógenas de glicocorticóides ou progestágenos foram identificados como fatores predisponentes.
Figura: Fisiopatologia da Diabetes Mellitus
Diagnóstico:
O diagnóstico da doença requer a presença das manifestações clínicas (poliúria, polidipsia, polifagia e perda de peso) associadas à constatação de hiperglicemia persistente após jejum alimentar de 8 horas e glicosúria.
Tratamento:
Estabelecido o diagnóstico, deve ser iniciado imediatamente o tratamento cujo objetivo primário é a redução da sintomatologia consequente à hiperglicemia e glicosúria, bem como evitar a ocorrência de complicações associadas a pacientes diabéticos, como cetoacidose e infecções secundárias. A insulinoterapia é a base do tratamento da diabetes de cães e gatos, e vários tipos de insulina foram testados com sucesso para tratamento nestas espécies. A aplicação da insulina pode ser realizada com seringas ou canetas aplicadoras, como em humanos.
Constantes ajustes na dose de insulina, no manejo nutricional, monitoramento da glicemia, da ingestão de água e controle de peso são necessários durante todo o tratamento.
Figura: Animal diabético, fêmea, SRD, extremamente magro, com escore de condição corpórea (ECC) de 1 (1-5) antes da terapia (A e B), (C) 30 dias após tratamento.
HIPERADRENOCORTICISMO
(síndrome de Cushing)
O Hiperadrenocorticismo, ou síndrome de Cushing, é a doença hormonal mais diagnosticada em cães. Consiste em uma condição na qual há um excesso de produção de hormônio cortisol pela glândula adrenal (supra renal).
Pode ter origem hipofisária – nódulo produtor de ACTH -, ou adrenal – superprodução de cortisol pela glândula adrenal. Em ambas as situações, o animal produzirá o cortisol em excesso e a manifestação clínica será a mesma.
Diagnóstico:
É feito através da avaliação clínica, aliada a exames de imagem (ultrassom abdominal), exames de sangue gerais (para avaliar as funções do fígado, rins, hemograma, triglicérides e colesterol, etc), além do exame funcional da glândula (teste de supressão com baixa dose de dexametasona e/ou o teste de estimulação com ACTH). Os sinais mais frequentes dessa doença são: poliúria (aumento da frequência e volume de urina); polidipsia (aumento de ingestão de água); polifagia (aumento do apetite); ganho de peso; alterações dermatológicas, como rarefação dos pelos, pele fina com evidenciação de vasos, lesões de pele descamativas e/ou piodermites; abaulamento do abdômen; atrofia de musculatura; tremores dos membros.
As alterações laboratoriais normalmente encontradas são: aumento da fosfatase alcalina, aumento do número de plaquetas, aumento de ALT e GGT (enzimas hepáticas). Hiperlipidemia (aumento de triglicérides e colesterol). No exame físico comumente há aumento de pressão arterial sistêmica e hiperglicemia.
Tratamento: Vai depender da origem da doença. Para os tumores de adrenal, a recomendação é a remoção cirúrgica da glândula acometida. Quando a causa é hipofisária, a droga de escolha para a redução dos níveis de cortisol é o Trilostano.
Em média a sobrevida dos pacientes é de 4 anos após o diagnóstico. Além do tratamento adequado, os pacientes precisam de monitoramento constante, com exames de sangue e ultrassom abdominal periódicos.
Figura: Tommy, canina, Yorkshire, macho, 10 anos - paciente portador de hiperadrenocorticismo.
Figura: Síndrome de Cushing em linguicinha
HIPOADRENOCORTICISMO
(síndrome de Addison)
Cães fêmeas são afetadas com maior frequência. Cães jovens, entre quatro e cinco anos, são geralmente mais afetados que os mais idosos. Qualquer raça pode ser afetada. Hipoadrenocorticismo é o resultado da diminuição da produção de hormônios esteróides pelas glândulas adrenais. Pode ser classificada de acordo com a origem em hipoadrenocorticismo primário e secundário.
O hipoadrenocorticismo primário caracteriza-se pela deficiência na secreção de glicocorticóide (cortisol) e mineralocorticóide (aldosterona) pelo córtex adrenal, causada geralmente por destruição imunomediada desta glândula. No hipoadrenocorticismo secundário (menos freqüente) tem-se secreção deficiente de glicocorticóides em consequência ao déficit hipofisário de ACTH. É importante ressaltar que a secreção de glicocorticóides pelas adrenais é estimulada pelo ACTH. Na falta deste hormônio, a camada fasciculada do córtex adrenal (camada responsável pela produção de glicocorticóides) sofre atrofia. Nota-se que a produção de mineralocorticóides está preservada uma vez que a camada responsável pela sua produção (camada glomerulosa do córtex adrenal) não é controlada pelo ACTH, mas sim pelo sistema renina-angiotensina.
Sintomas:
Os sinais clínicos são muito variáveis e dependem da severidade e da evolução da doença. Alguns cães apresentam sinais crônicos e intermitentes (por exemplo, êmese e diarréia) enquanto que outros apresentam quadros agudos e chegam ao hospital veterinário em choque (hipotensos, bradicárdicos e hipoglicêmicos). As alterações clínicas não são específicas e sim comuns a uma variedade de outras doenças. No entanto, deve-se suspeitar de hipoadrenocorticismo crônico quando uma doença tem seus sintomas exacerbados pelo estresse e respondem a tratamentos inespecíficos e à terapia de suporte.
Diagnóstico:
Em muitos casos, alterações nos exames de rotina, como hemograma, perfil bioquímico e exames de urina vão levantar a suspeita de Doença de Addison. Radiografias do tórax podem revelar redução do tamanho do coração e aumento do esôfago. Um eletrocardiograma pode mostrar alterações, se a concentração de potássio estiver muito alta.
O diagnóstico definitivo vai depender dos resultados de um exame do funcionamento da glândula adrenal, chamado de Teste de estimulação do ACTH. As taxas de cortisol, um dos hormônios principais produzidos pela glândula adrenal, são medidas antes e depois da administração de ACTH, sintético ou natural.
Tratamento:
O tratamento consiste na reposição de glicocorticóides e/ou mineralocorticóides e se necessário terapia de suporte.
As metas primordiais do tratamento são a correção dos déficits de volume de fluidos, a melhora da integridade dos vasos sanguíneos, além de estabelecer uma fonte de glucocorticóides para corrigir as anormalidades eletrolíticas e ácido-básicas e confirmar o diagnóstico. Os deficits de volumes de fluidos são corrigidos de forma apropriada pela administração de soro por via intravenosa, geralmente se utiliza soro fisiológico. Se há suspeitas de baixa concentração de açúcar no sangue, deve-se suplementar o soro com dextrose.
Glucocorticóides geralmente são administrados através de injeção. Glucocorticóides que não afetem o teste de estimulação de ACTH são melhores do que aqueles que dificultam a confirmação do diagnóstico de Doença de Addison, quando administrados antes do teste. Os desequilíbrios eletrolíticos são corrigidos através de soro intravenoso e também com a administração de drogas repositoras de mineralocorticóides. Estas drogas geralmente não são usadas até a confirmação do diagnóstico, já que as outras medidas de estabilização das crises em cães, costumam ser bem sucedidas nos casos de doença de Addison. Algumas vezes será necessário tomar medidas específicas, como a administração de glicose, insulina, cálcio e bicarbonato de sódio, para baixar concentrações muito altas e perigosas de potássio.
O bicarbonato também pode ser usado para tratamento dos animais com grandes alterações do equilíbrio ácido-básico. A maioria dos animais em crise melhora em uma ou duas horas, com tratamento apropriado. Os fluidos intravenosos geralmente são mantidos de 24 a 48 horas, até que o cão consiga comer e beber sem vomitar. A partir daí, as injeções podem ser substituídas por medicação oral. Uma vez superado o período de crise, os cães podem receber mineralocorticóides injetáveis ou por via oral. A medicação por via oral deve ser dada diariamente, geralmente duas vezes ao dia, e às vezes são necessárias doses muito altas para controlar a doença. O mineralocorticóide injetável mais usado é o DOCP. É administrado por via intramuscular, a cada 25 dias aproximadamente, e é quase sempre eficaz. Para muitos cães, especialmente os maiores, a medicação injetável é bem mais barata do que a oral. A maioria dos cães portadores do Doença de Addison reage bem só com a reposição de mineralocorticóides, mas outros também precisam de suplementação de glucocorticóides com prednisona. Apesar de gravidade da Doença de Addison, este pode ser mantido sob controle com medicamentos, na grande maioria dos cães. Alguns animais portadores de insuficiência na produção de glucocorticóide, entretanto, necessitarão de suplementação durante períodos de stress.
TESTE DE SUPRESSÃO COM DEXAMETASONA
O teste de supressão com baixa dose de Dexametasona é utilizado para confirmar o Hiperadrenocorticismo ou doença de Cushing. A manifestação clínica dessa patologia é decorrente da exposição crônica ao excesso de glicocorticóides. O paciente deve estar livre de cortisona por pelo menos 60 dias.
Material:
1 mL de soro sem hemólise. Jejum obrigatório de 12 horas.
Instruções:
Coletar a amostra basal, centrifugar e transferir o soro para um tubo de transporte devidamente identificado e congelar.
– Injetar 0,015 mg/kg (0, 15 mg/kg em felinos) por via intravenosa de AZIUM.
– Coletar as amostras 4 e 8 horas após-injeção. Centrifugar as amostras e transferir o soro para tubos de transporte devidamente identificados como 4 e 8 horas após a injeção.
– Congelar e manter congelado ate chegar ao laboratório.
– Identifique claramente os tubos.
– Jejum obrigatório de 12 horas;
– Usado para diferenciar cães normais daqueles com Síndrome de Cushing.
Método:
Quimioluminescência
HIPOTIREOIDISMO
Trata-se de uma desordem sistêmica que resulta de concentrações séricas inadequadas de hormônios da tireóide. Pode ser classificado em primário, secundário ou terciário.
Em cães, o hipotireoidismo geralmente resulta de lesões primárias na tireóide, especialmente a atrofia idiopática e a tireoidite linfocítica. O hipotireoidismo secundário é resultante de lesões hipofisárias decorrentes de tumores ou anormalidades congênitas, com conseqüente deficiência na síntese de TSH, enquanto que o hipotireoidismo terciário é devido a uma deficiência de TRH. Nota-se que os dois últimos não são freqüentes.
Sinais Clínicos:
Os sinais clássicos desta doença incluem obesidade, letargia, fácies trágica, alopecia e outras alterações dermatológicas (hiperqueratose, hiperpigmentação, seborréia, foliculite, piodermite e furunculose recidivantes). Podem ocorrer anormalidades reprodutivas, anormalidades envolvendo o sistema nervoso central e periférico, sistema cardiovascular e gastrointestinal, anormalidades hematológicas e coma por mixedema.
Diagnóstico:
Os resultados do hemograma, exames bioquímicos e da urinálise podem indicar o diagnóstico de hipotireoidismo e descartar outros distúrbios (CATHARINE et al., 2004). Os achados clinicopatológicos mais consistentes em cães com hipotireoidismo são hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia.
O melhor método para confirmar um diagnóstico clínico do canino hipotireóideo é o teste da estimulação da tireotropina (TSH).
Tratamento:
A levotiroxina constitui o tratamento de escolha para a maioria dos pacientes hipotireóideos. T4 oral absorvida será convertida como T3 conforme a necessidade das células.
O sucesso da terapia ocorre através da monitoração terapêutica por testes da função da tireóide (FINORA e GRECO, 2007). Observa-se uma resposta ao tratamento com aumento na atividade e melhora na atitude, geralmente dentro de uma a duas semanas. O ganho de peso e as anormalidades neurológicas começam a melhorar dentro de uma a quatro semanas, enquanto as alterações dermatológicas podem levar quatro a seis semanas para melhorar e meses para se resolver completamente. Uma falha na resposta dentro de seis a oito semanas após o início do tratamento deve estimular uma reavaliação do diagnóstico (PANCIERA et al., 2003). A dieta deve ser reduzida em gordura até que o peso corporal fique satisfatório e a concentração da T4 fique normal (TILLEY e SMITH, 2003).
Figura: Hipotireoidismo
Figura: Chansey, canina, Cocker Spaniel, fêmea, 05 anos - paciente portador de hipotireoidismo. Nota-se presença de fácies trágica (foto à esquerda)
HIPERTIREOIDISMO
O hipertireoidismo é um distúrbio metabólico sistêmico resultante da produção excessiva de hormônios tireoidianos, frequente em gatos de meia idade a idosos e rara em cães. Geralmente a produção excessiva de hormônios tireoidianos é decorrente de tumores benignos que podem ser uni ou bilaterais. Os tumores malignos correspondem a apenas 5% dos casos.
Sinais clínicos:
Os sinais clínicos característicos do hipertireoidismo são perda de peso, polifagia e hiperatividade. Outros sinais, menos freqüentes, também podem ser observados, tais como mudanças na pelagem (alopecia em placas, pêlos embaraçados, comportamento excessivo de lambedura), poliúria, polidipsia, êmese e diarréia. Alguns felinos apresentam comportamento agressivo, que se resolve após o tratamento.
Diagnóstico:
O diagnóstico baseia-se na presença de sinais clínicos característicos (polifagia, perda de peso e hiperatividade), presença de nódulo palpável na tireóide e aumento das concentrações séricas de T4. Nota-se que nos casos de hipertireoidismo leve ou oculto as concentrações séricas de T4 podem estar normais.
Tratamento:
Atualmente há três opções terapêuticas para o tratamento: medicação antitireoidiana, tireoidectomia e radioterapia. Cada protocolo terapêutico tem suas vantagens e desvantagens. Assim, cada caso deve ser avaliado individualmente e discutido com o médico veterinário especializado em endocrinologia e metabologia veterinária.
REFERÊNCIAS
ENDOCRINOVET. Diabetes insipidus. Disponível em: http://www.endocrinovet.com.br/principaisDoencas.htm#default. Acesso em: 02 dez. 2022.
MONTANHA, Francisco P. HIPOTIREOIDISMO CANINO – REVISÃO. Editora FAEF - 2011. Disponível em: http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/1ozIVPK2Cm5WlLx_2013-6-27-15-34-43.pdf. Acesso em: 02 dez. 2022.
DIAGNOVET Laboratório Veterinário. CORTISOL – TESTE DE SUPRESSÃO COM DEXAMETASONA – BAIXA DOSE (CÃES/GATOS). Disponível em: https://www.diagno.vet.br/avada_faq/cortisol-teste-de-supressao-com-dexametasona-baixa-dose-caes-gatos/. Acesso em: 02 dez. 2022.
RENALVET. Hipoadrenocorticismo – Doença de Addison. Disponível em: https://renalvet.com.br/especialidades-veterinarias/endocrinologia-2/hipoadrenocorticismo/. Acesso em: 02 dez. 2022.
CENTROVET - Centro de Especialidades Veterinárias. Hiperadrenocorticismo: você sabe o que é?. Disponível em: https://centrovet.bhz.br/site/hiperadrenocorticismo/. Acesso em: 02 dez. 2022.
PÖPP, A. L. Et al. DIABETES MELLITUS CANINA E FELINA. Disponível em: https://vetsmart-parsefiles.s3.amazonaws.com/b7f467e6f8893ed68555d698415ef7dc_streaming_attachment.pdf. Acesso em: 02 dez. 2022.